[RESENHA] Extensão do domínio da luta

Extensão do domínio da luta, de Michel Houellebecq


Prazo de leitura: de 21/12/2018 até 22/12/2018

Essa foi minha primeira incursão nas obras de Michel Houellebecq depois de ler várias críticas positivas sobre ele.


Na Wikipedia ele é assim retratado:

"Michel Houellebecq, nascido Michel Thomas (Ilha da Reunião, 26 de fevereiro de 1958), é um escritor francês. Ficciconista, poeta, ensaísta, realizador, argumentista, Houellebecq é um dos mais traduzidos autores franceses contemporâneos, e também um dos mais controversos. Michel Houellebecq é o enfant terrible da literatura francesa atual. Odiado e amado, os seus livros abordam sempre temas na moda e são altamente polêmicos, porque ele tem sempre um ponto de vista iconoclasta sobre os problemas.

Seus romances Partículas Elementares e Plataforma lhe valeram uma reputação internacional de provocador, embora sejam também frequentemente considerados como um sinal de renovação da literatura francesa. Com o livro La Carte et le Territoire, Michel Houellebecq recebeu o prêmio Goncourt de 2010, o mais prestigioso da literatura francesa." (Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Michel_Houellebecq adaptado ao português do Brasil)

Ele tem uma forma peculiar de escrever.

Para muitos, uma escrita um pouco difícil de ser compreendida é vista como sinal de superioridade do autor, mas não vejo dessa forma. Muitas vezes o desejo de parecer incompreendido e superior às massas faz com que produtores de conteúdo criem obras realmente ruins e ininteligíveis, mas gratamente esse não é o caso de Houellebecq. Ele escreve de uma forma um tanto enigmática e que parece não ter sentido nas primeiras páginas, mas a compreensão do todo vem ao final da leitura, o que a salva de ser uma "tentativa de discussão filosófica mal feita".


O ENREDO


O livro é todo narrado em primeira pessoa, sem qualquer enredo aparente: não há um ponto de partida rumando a um desfecho, mas apenas pensamentos soltos sobre si mesmo e um pouco de ações e movimentações.

Ao ler tive a impressão de estar bem próximo de uma mistura de estilos, mais afeito a Rubem Fonseca, Henry Miller e uma "tentativa de Proust". A tendência maior, para mim, era Miller.

Refletindo sobre si mesmo, num quase fluxo de consciência proustiano, o personagem, que não tem nome, narra episódios bem ordinários do seu cotidiano e assume tons bastante preconceituosos em relação a mulheres, negros e imigrantes (afinal a estória se passa na França, palco fértil pra tudo isso). 

Basicamente narra um recorte de tempo na vida do protagonista, que é técnico de informática, mostrando uma viagem de trabalho que fez e abordando suas impressões sobre tudo à sua volta, desde os lugares, passando às pessoas que não conhece, aos colegas e chefes no trabalho, em geral todas pessimistas e preconceituosas. Não há menção à família, exceto um rompimento que teria ocorrido dois anos antes.

A narrativa tem um tom pessimista e hegemonista no que tange ao protagonista, cuja conclusão experimental é que o sexo é um super motivador existencial e que não adianta resistir aos seus impulsos. Aproveita para retratar a sociedade parisiense, que ele considera hipócrita e baseada no compadrio para a nomeação para cargos importantes (o autor se ressente de seu novo chefe ser mais novo que ele e já diz que o odeia assim que é apresentado, além de informar que seu antigo chefe lhe dava os piores trabalhos unicamente para esbanjar o poder que tinha sobre ele).

Diferente de Proust, a leitura aqui é fluida e rápida porque os fluxos de pensamento são apenas pontes para as ações e não uma forma profunda de conhecer o protagonista. Semelhante a Fonseca e Miller, tem bastante obscenidade, palavras de baixo calão e uma moral que deixa muito a desejar, já que a tese aqui é que sexo é dominador e irresistível.


CONCLUSÃO


Como reflexão sobre a sociedade, que é o substrato não evidente do livro, a obra é ímpar e merece ser lida, embora necessário frisar que a visão é bastante pessimista e não retrata qualquer nicho ou grupo social dissidente ou dominante, pelo menos não com clareza.

Não o vi como um divisor de águas, nem como a melhor retratação da sociedade atual, tampouco me pareceu a obra de um inconformado. 

Desse modo, por si só já se mostra um tanto instigante, porque escrever para criticar tudo e todos sem aparentemente estar na situação de gueto ou de minoria social tanto pode parecer o que atualmente se chama de "resistência de iPhone", constituída basicamente daquela garotada que se deixou seduzir pela ideologia de esquerda mas são majoritariamente da classe média ou mais, nunca tiveram trabalhos braçais, nem passaram necessidades físicas, mas adoram posar de estandarte dos excluídos, como pode denotar um sentimento genuíno de revolta que é seguido de ações concretas.

Se as "resistências" são feitas apenas em redes sociais e bem longe dos excluídos, não passa de hipocrisia, mas se a resistência à exclusão permeia um "colocar-se no lugar do outro" e realizar ações concretas de inclusão (distribuição de alimentos, fomento a divulgação cultural, inclusão educacional, etc.) então é algo nobre. 

Inteligente é saber distinguir um do outro e parar de dar holofotes e palcos aos atores errados. Confesso que eu não sei como classificaria o autor.

Tenho outros livros de Houellebecq que, agora, suspeito que também lerei de um só fôlego, como este.

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